sábado, 22 de janeiro de 2011

Linguagem: papel determinante na constituição do Sujeito




Olá, meus amigos!

Resolvi postar aqui parte de um artigo que produzi para obtenção do título de especialista em Psicopedagogia. O artigo é muito mais extenso, tem como título Oralidade e Escrita: fenômenos discursivos necessários à voz dos grupos subalternos, mas quem desejar lê-lo pode falar comigo. No texto abaixo, no entanto, refiro-me à luta incessante de alguns intelectuais que desejaram levar a todos os grupos sociais o poder do discurso, seja ele oral, corporal, ilustrado ou escrito. Neste trecho refiro-me mais a Antônio Gramsci, Paulo Freire e Dermeval Saviani, mas poderia  falar de muitos outros, e falo: no artigo completo.

Abraços e boa leitura,

Atanael

A luta de Antonio Gramsci no processo para formação de uma nova moral e cultura, que também desse voz às classes subalternas, sempre foi incansável. Ele já sabia que todas as camadas sociais possuem seus intelectuais, sejam esses profissionais, ou inclusos nesta categoria por comungarem de determinada visão de mundo. Nesse sentido, não há como deixar de lado algumas reflexões a respeito da Literatura de Cordel, visto que esta, em se tratando de Brasil, foi e é ainda responsável por comunicar, a partir de seus cordelistas, a voz dos menos favorecidos. Além disso,  pode-se dizer que nos dias de hoje, ainda, valoriza-se a cultura oral, provando que, apesar da ausência de escolarização, essa literatura a partir do Cordel, do teatro popular, do cancioneiro regional, assim como os registros da cultura afro-brasileira e indígena constitui uma rica cultura que foi preservada até os dias de hoje, graças aos intelectuais que decidiram um dia registrá-la através da escrita.
Acompanhando essa linha de raciocínio pode-se contar aqui com as palavras de Paulo Freire (1987 – p.44): “A existência, porque humana, não pode ser muda, silenciosa, nem tampouco pode nutrir-se de falsas palavras, mas de palavras verdadeiras, com que os homens transformam o mundo. Existir humanamente, é pronunciar o mundo, é modificá-lo. O mundo modificado, por sua vez, se volta problematizado aos sujeitos pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar”. Foi assim a força que a Pedagogia Progressista de Paulo Freire imprimiu na tomada de decisões contra-hegemônicas, sobretudo na sala de aula proposta por ele, espaço circular e democrático, que visa respeitar o que aluno traz da sua cultura ao socializar com o grupo em questão e elaborar o conhecimento ao permitir que o mesmo use o seu pensamento para poder analisar o que acontece consigo e com os outros, na sua relação com o mundo.
            A preocupação com a necessidade de imprimir força à cultura subalterna também está em Saviani (2001, p.55) quando ele destaca: “O dominado não se liberta se ele não vier a dominar aquilo que os dominantes dominam. Então, dominar o que os dominantes dominam é condição de libertação”.  Desse modo, é necessário que a resistência do aluno em relação à escrita, colocada na sociedade moderna como proclamadora da superioridade das diferenças em relação à cultura oral, seja bem trabalhada.   Por outro lado, pode-se considerar que a resistência do sujeito oralista em relação à escrita já vem de longe, e que já está registrada na historigrafia da humanidade, sobretudo quando pensamos no Período Medieval, que nos dá a noção de que a aprendizagem de um novo código, como a escrita, está também fortemente ligada às guerras e batalhas culturais que o homem travou nesse período, e que, segundo Flusser (1985), nesse tempo se deu em forma de luta entre o cristianismo textual e o paganismo imaginístico; e que já na Idade Moderna, luta entre a ciência textual e as ideologias imaginísticas.
            A capacidade intelectual não é monopólio de alguns, mas sim, pode-se dizer que pertence à coletividade, haja vista que todos são intelectuais, pois toda atividade humana exige uma intervenção intelectual. Não há atividade, por mais alienada que seja considerada, que não exija um momento de reflexão, assim como se pode dizer que todo ser humano tem uma cultura, sendo ainda, que elabora sua concepção de mundo no interior de seu ambiente social. Desta forma, pode-se ainda considerar que no sentido diacrônico todo ser humano constrói conhecimentos ao longo de sua história, bem como no sentido sincrônico se fazem necessárias algumas intervenções que colaborem no sentido de proporcionar a todos os grupos sociais, em especial aos subalternos, a utilização das ferramentas que já possuem – e que muitas vezes não são usadas ou não sabem como usá-las – para que os auxiliem no exercício da busca por si, e compreendam as interconexões que formam o mundo em que vivem.
         Nesse sentido, pode-se considerar a interação humana, via linguagem oral e escrita, um lugar de constituição de relações sociais que permite ao falante subalterno também ser sujeito, sendo ainda capaz de mudar o outro com a ação peculiar de seu discurso, assim como transformar-se pelo discurso do outro. Este exercício de intelectualidade, no entanto, deve ser democrático e capaz de permitir que esses sujeitos se coloquem como grupo social, vinculados a um determinado modo de produção que exige deles uma outra voz e visão, mais inovadoras e revolucionárias, e capazes de romper com a concepção de que existe apenas um intelectual, o tradicional, que é considerado superior e detentor da verdade.
         Isso significa ainda dizer que a construção da subjetividade humana passa necessariamente pela ação do outro, sendo necessário, ainda, ressaltar que não existe uma cultura superior em relação a uma outra. Deste modo, faz-se necessário valorizar o patrimônio cultural e social de cada ser humano, assim como divulgá-lo, quando possível, nas variadas interações sociais a que temos o privilégio de participar. Pois são as manifestações humanas - orais, escritas, corporais e/ou ilustradas - que permitem aos sujeitos de todos os grupos sociais se colocarem para confrontarem suas idéias e opiniões e hibridizarem seus conhecimentos.

Referências para este texto:
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 17ª. Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987, p.44.
FLUSSER, V. Filosofia da Caixa Preta: ensaios para uma futura filosofia da fotografia. Tradução do autor. São Paulo: Editora Hucitec, 1985, p. 8.
GRAMSCI, A. Cadernos do Cárcere, 6 vols. Edição de Carlos Nelson Coutinho c/colaboração de Luiz Sérgio Henrique e Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1999-2002.
LUYTEN, J. M. O que é Literatura de Cordel. São Paulo: Brasiliense (Coleção Primeiros Passos, 2007, p. 12; 46-70.
SAVIANI, Dermeval. Escola e Democracia: teoria da educação, curvatura da vara, onze teses sobre educação política. 34ª edição revista. Campinas – SP: Autores Associados (Coleção Polêmicas do Nosso Tempo), 2001, p. 35-44.

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